Entre
química e impurezas, desenhos corporais injetam no organismo um sem
número de substâncias tóxicas, muitas vezes nem testadas. Especialistas
presumem que sejam cancerígenas, mas não há estudos nem leis
suficientes.
Quem
gostaria de injetar alguns gramas de verniz de carro sob a pele? Ou um
pouco de fuligem resultante da combustão de petróleo ou alcatrão?
Provavelmente
ninguém. Mas isso é o que recebem todos os que se deixam tatuar. "Os
pigmentos para tatuagens contrastantes e de longa duração foram
desenvolvidas para cartuchos de impressora e tintas de automóveis",
revela Wolfgang Bäumler, professor do Departamento de Dermatologia da
Universidade de Regensburg, em entrevista à DW.
Acima
de tudo, as tintas de tatuagem não foram desenvolvidas para estar sob a
pele. Grandes empresas químicas fabricam toneladas de pigmentos
coloridos, principalmente para fins industriais; empresas pequenas os
compram e transformam em produtos para tatuagem.
"As
substâncias nunca foram testadas para aplicação subcutânea", diz à DW
Peter Laux, do Instituto Federal Alemão de Avaliação de Riscos (BfR) em
Berlim.
"A própria grande indústria diz que, na verdade, os pigmentos não são feitos para isso."
Da pele para o organismo inteiro
Wolfgang
Bäumler acrescenta que as tintas de tatuagem precisam ser "brutalmente
insolúveis em água". Isso já torna a prática perigosa, pois o corpo não
tem como se livrar facilmente delas. De acordo com um recente estudo
americano, apenas dois terços dos produtos utilizados nas tatuagens
permanece sob a pele: o restante se espalha pelo corpo.
"As
substâncias vão para o sangue, para os nódulos linfáticos, os órgãos, e
vão parar em algum lugar. Onde, exatamente, não se tem ideia", relata o
dermatologista.
Numa sessão de tatuagem, produtos químicos não testados são lançados no organismo
Os
produtos químicos para as cores vermelho, laranja e amarelos são
compostos azólicos – substâncias orgânicas com uma má reputação, que
costumam desencadear alergias. Algumas delas, como o Pigment Red 22,
podem se decompor, se a tatuagem for exposta á luz solar, diz Bäumler.
Os compostos resultantes são tóxicos e cancerígenos.
Compostos
chamados ftalocianinas, que resultam em azul e verde brilhante,
geralmente contêm cobre e níquel. Também nos pigmentos marrons com
óxidos de ferro, muitas vezes há presença de níquel. O metal provoca
alergias de contato em muitas pessoas e é proibido em cosméticos. Nos
produtos para tatuagens, contudo, ele continua sendo frequente.
Tatuagens
pretas, por sua vez, são feitas com derivados de um material chamado
Carbon Black. Ele nada mais é do que fuligem industrial, produzida
quando a indústria química queima petróleo, alcatrão ou borracha.
Impurezas cancerígenas
No
entanto os especialistas salientam que não só as cores são perigosas.
"Além dos elementos corantes, produtos para tatuagem podem também conter
outras substâncias, como solventes, espessantes, conservantes e
diversas impurezas", adverte o BfR.
De
acordo com Peter Laux, impurezas são a regra, não a exceção. "Os
departamentos regionais de diagnóstico se queixam regularmente sobre a
qualidade química das substâncias para tatuagem que eles controlam."
Entre
essas impurezas, os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos são
particularmente perigosos. Formados durante as combustões incompletas,
também na produção de fuligem, muitos são comprovadamente cancerígenos.
Nas tintas pretas para tatuagem, estão muitas vezes presentes em
concentrações acima do limite recomendado.
"Consta
que os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos se desprendem
continuamente durante o processo de tatuagem e se espalham pelo corpo.
Os níveis medidos são um risco sério à saúde e segurança dos
consumidores", adverte o BfR.
Laux
acrescenta que "também há no mercado substâncias para tatuagens que
cumprem os requisitos". No entanto, é difícil para o consumidor definir
qual substância é boa e qual não.
[Segundo FDA, cerca de 25% dos americanos têm tatuagem]
Segundo FDA, cerca de 25% dos americanos têm tatuagem
Regulamentação insuficiente
Na
Alemanha e em muitos outros países, as substâncias para tatuagens não
são consideradas nem medicamentos nem cosméticos – e aí reside o
problema. Porque esses produtos precisam atender determinados requisitos
antes de poder sequer entrar no mercado. No caso dos medicamentos,
análises de segurança mostram o que acontece exatamente com uma
substância no corpo, como ela é metabolizada, e quais outras substâncias
podem se formar a partir dela. Para as tatuagens, não há tais
regulamentações.
Em
2008, o Conselho Europeu expediu uma resolução determinando o controle
mais rigoroso dos produtos para tatuagens, e muitos países implementaram
leis e regulamentações concernentes. Mas, de acordo com Peter Laux,
todas são insuficientes.
Uma
portaria relativa a substâncias de tatuagem de 2009 proíbe na Alemanha o
uso de certas substâncias, e uma lista especifica exatamente o que é
proibido. "Todas as demais substâncias são permitidas, mesmo produtos
químicos que acabam de ser desenvolvidos por um fabricante e nunca foram
previamente testados."
"Precisamos
criar listas positivas", reivindica Laux. Isso significa, que ao invés
de substâncias proibidas, a portaria deveria conter as permitidas que
tiveram a sua segurança comprovada.
Incerteza é única certeza
[Em diversas sociedades, tatuagem é símbolo cultural antigo. Por exemplo na máfia Yakuza do Japão]
Em diversas sociedades, tatuagem é símbolo cultural antigo. Por exemplo na máfia Yakuza do Japão |
Até
mesmo tatuadores profissionais concordam que a situação não é
satisfatória. "Em nossa opinião, no momento as tintas de tatuagem não
são realmente seguras", admitiu Andreas Schmidt, vice-presidente da
associação Tatuadores Alemães Organizados, num simpósio em Berlim sobre a
segurança dos produtos empregados.
Ele
exige testes toxicológicos para os componentes, mas acrescenta:
"Estamos otimistas de que há apenas alguns problemas com as tintas, caso
contrário haveria mais reclamações de clientes e mais matérias em
jornais e revistas".
No
entanto, os especialistas lembram que o câncer muitas vezes precisa de
décadas para se desenvolver, e a conexão não é tão fácil de provar.
Até
agora, as substâncias para tatuagens não são testadas quanto a seus
riscos. Faltam estudos em seres humanos, de curto quanto e de longo
prazo. Experimentos em animais são proibidos. O dermatologista Bäumler
foi judicialmente impedido de efetuar um teste de produtos de tatuagem
em porcos. "A justificativa foi que as pessoas que se deixam tatuar o
fazem voluntariamente", conta.
Portanto, ninguém ainda pode afirmar ainda se tatuagens são prejudiciais à saúde ou não. Talvez provoquem câncer – talvez não.
Peter
Laux arremata que cada um deve decidir por si se quer fazer uma
tatuagem ou não – o BfR não faz nenhuma recomendação. "Até agora só
sabemos que não há qualquer garantia de que as substâncias para
tatuagens sejam seguras para a saúde."
Fonte: DW Ciência
Nenhum comentário:
Postar um comentário